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domingo, 19 de abril de 2009

Margarida, minha flor da sorte

Raira agora tem 14 anos. Notei que depois de uns quatro anos, ela, de alegre e faladeira, se fechou. Como a fase da adolescência é bem frágil, minhas interrogações sobre o que estava ocorrendo haviam de ser sutis..Mas, por outro lado não obtive conclusão alguma..

Ela não tem vaidade, o que é incomum para alguém de sua idade cuja ordem da vez é a imagem, a estética..Nem se olhava no espelho o que é estranho. Por que ignora-se o espelho numa fase em que somos naturalmente belos? Afinal só quem precisa usar Renew e Chronos sabe o que é beleza natural..

No entanto, ontem, percebendo o movimento de tirar fotos na máquina digital, fiquei a observar. Ela tirou várias, mas descartou todas, veio triste e finalmente disse “- Sou feia, olha o meu nariz como é enorme!”. Então, entendi tudo.. Aos poucos também me disse que quando entrou na quinta série da escola nova, uma colega riu e disse “– Olha o nariz de batata dela”

A estética para ela é o problema, essa é a raiz da auto-estima baixa, de não ter coragem de se ver no espelho nem de se aproximar de um grupo. Sua própria idéia de si a faz acreditar que sempre será motivos de risos, principalmente porque naquele ano, a colega disse a funesta frase que lhe colocaria em dúvida a própria imagem..

Interessante como crianças e adolescentes são cruéis com os outros e consigo mesmo. Antes dos 20 anos se diz coisas, tendo consciência delas, para tocar a ferida do outro cirurgicamente...Talvez senso competidor? Por outro lado, o auto-isolamento também é uma crueldade.

Sempre partilhei da idéia de que o Mal nasce conosco, porém, com a vivência, perde a força cedendo lugar ao bom-senso e a compreensão.

Eu disse à ela que não tem um nariz feio, é perfeitamente normal. Mas, ela preferiu a versão da amiga.

Raira sabe que existem pessoas com deformações físicas e que talvez sejam mais felizes que ela, mas, em alusão à Nietzsche , somos todos egoístas e só importa o nosso nariz..E isso ocorre em todas as idades..

Por outro lado, mesmo em casos do que se considera deformações físicas, qual o valor desse senso? Se os primeiros primatas nos vissem hoje correriam de nós. As vezes o DNA está tentando se aprimorar e muitas vezes evolui a partir do que era considerado erro. Por isso, mirar nas aparências é, algumas vezes, não ver a evolução.

Quando eu era adolescente também sofri com a estética porque tinha seios maiores que o das outras garotas. Aquilo para mim era uma tortura. Imaginava a todo o momento como remove-los e meu ódio por eles era tanto que pensava em retirá-los completamente numa plástica. Lembro-me de usar sutiãs hiper esmagadores com blusas de coton para que “sumissem” e ninguém mais me viesse com brincadeirinhas. A coisa só mudou quando surgiu a Mary Alexandre com silicone e daí a imagem da mulher com seios maiores melhorou, porém ainda assim, não gosto tamanho deles e ainda aguardo ter dinheiro suficiente para uma cirurgia plástica. O que me ficou foi a imagem da adolescência. Temos muitos complexos e por eles nos auto-rejeitamos.

No momento, só quero que a menina faça amigos, se aceite e aceite os demais, que compreenda que as coisas mudam. Pessoas e situações mudam, que consiga passar pela fase da estética e um dia compreenda que imagem não é muito sem nossa construção.

Bem, logicamente esse é o raciocínio mais coerente, mas como falei, também tenho meus complexos, aliás as vezes somos apenas complexos...Já passei, ou talvez passo, pelo sentimento que ela experimenta e não quero mais que ela sofra pela imagem já que tudo aqui na terra é transitório demais.

Seres humanos não se diferem dos demais animais porque tem raciocínio (esse as vezes nos mata), porém se diferem porque possuem capacidade de compaixão, de sentimentos. Algum animal fica com os filhotes mais tempo além da amamentação?

Ela sempre terá todo meu amor, não importa onde eu esteja. Para ela, ofereço fotos da minha flor da sorte, a Margarida.

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