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segunda-feira, 18 de maio de 2009

Se as peças estão todas soltas...

Quando eu fui trabalhar pela primeira vez, saindo de uma casa cujas permissões para sair eram raras, eu tive um susto.

Foi quase um terror conhecer partes de um mundo que eu nem imaginava existir quando estava somente dentro de casa.

Com 16 anos era mais do que hora para um integrante da classe média rasa ir “se virar”. Acabava-se o tempo de só estudos. E olha que eu agradecia, pois na mesma época que a minha, crianças com 12 anos já ingressavam no mercado de trabalho com carteira de trabalho.

Eu fui uma estudante assídua até chegar na 6ª série. Depois, a preguiça me preencheu e outros assuntos como o falatório, cheio de dúvidas e curiosidades, com amigas me eram mais objetivos. Na 6ª série reprovei pela primeira vez, depois na 8ª série e por último no 1º colegial. Mas, o difícil era agüentar a reprovação familiar. Lembro-me que me olhavam como uma inútil. Aliás, meu pai me disse isso um dia. Bem, acho que eu era mesmo. Somente com o tempo, na idade adulta, é que descobri que adolescentes não tem tanta necessidade de análise sintática como a de descobrir a si próprios. Mas, voltando ao assunto “primeiro emprego”.

Quando descobri o que era deixar de passar seis horas ou na escola ou em casa para passar 8 horas continuando a receber ordens e dessa vez mais ostensivas e ainda ficar mais 5 horas estudando a noite, pensei que iria implodir.

Meu primeiro emprego foi numa escolinha infantil, até que era legal, mas não pagavam quase nada, era um terço de um salário mínimo. Depois fui para uma Confecção de roupas, o trabalho era em pé por quase seis horas e tinha que observar o ânimo dos empregadores que quase nunca eram os dos melhores. Pedi para sair e fui para uma Concessionária de caminhões, trabalhava numa função hoje inexistente, chamada cardex. No início não gostavam muito de mim e não me tratavam bem porque eu demorava muito para acertar o trabalho. Nessa época eu ouvia muito uma música chamada “Isso é só o fim” do grupo Camisa de Vênus, até pensava que tinha sido feita para mim, especialmente quando dizia “- Se o chão abriu sobre os seus pés e a segurança sumiu da faixa e as peças estão todas soltas e nada mais se encaixam...”

No entanto, para meu espanto dominei tudo aquilo e depois decidi sair. Daí fui para uma Indústria Química. No início, mesma coisa, demora a aprender todo aquele trabalho e me sentia um “nada” quando tudo aquilo acontecia e as pessoas ficavam bravas. Lá eu iniciei como telefonista e depois fui para secretária. Todavia, acabou sendo o melhor lugar da iniciativa privada que trabalhei. Lá fiz amigos inesquecíveis e sempre os tive como a família que idealizei. Sem dizer que com o salário de lá é que paguei minha primeira universidade no período noturno.

Por último, quase sem querer, me tornei professora. E nesse trabalho foi o contrário. Adorei o início, me sentindo até importante. Adorei cada livro que li e cada vez que utilizei o quadro negro. Porém, agora, treze anos depois, tem hora que o trabalho não é mais do que obrigação. O prazer se esvai.

Não assusto mais com a grosseria, indiferença ou o mau humor das pessoas, especialmente daquelas que têm certeza de que são as melhores. Porém, acredito que estou cansada de fazer sempre a mesma coisa, mesmo de formas diferentes. Eu gostaria muito de trabalhar com comunicação e quem sabe eu ainda mude de emprego.

Embora as pirâmides, perfeitas, do Egito foram feitas por escravos, dizem que a qualidade do trabalho depende diretamente do prazer que temos em fazê-lo e eu concordo.

As coisas melhoraram muito quando passou a sutil fase da puberdade. Ai sim meu cérebro começou a me ajudar. Acho que o córtex assumiu o controle.

Talvez o trabalho tenha nos sido imposto pelo pecado capital. Não obstante, temos chances de nos realizarmos através dele. A função que exerço agora, não me fez sofrer como as anteriores, mas anda caindo no tédio da repetição sistemática, o que me incomoda.

Levei muito tempo para começar a entender as pessoas, a mim mesma e a importância libertadora de ser uma estudante. Não sei se tinha que ser assim e se fosse diferente seria melhor. As coisas sempre levam uma eternidade para passar se estamos infelizes e sempre temos a certeza de que somos vítimas. Embora eu tenha precisado, talvez, de mais tempo que os demais, acho que agora me sinto mais depurada e espero levar o restante da vida com muito bom-senso, com mais compreensão, especialmente com os mais jovens..

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